HUC sobrelotado, Covões subaproveitado
O SMZC realizou a 12 de Julho visita aos dois polos de urgência de adultos do CHUC. Encontrou duas realidades distintas, ambas chocantes, por motivos distintos.
O polo HUC a abarrotar de doentes, onde encontrámos uma urgência sobrelotada, com doentes à espera de triagem em condições desumanas, sob um calor abrasador. Na Área Médica 2 deparámo-nos com uma sala enorme em que cada divisão destinada a 1 único doente, está ocupada por 4, macas encostadas umas às outras, em dupla e tripla fila, distribuídas à volta de uma zona central da sala onde estão médicos e enfermeiros. Doentes dispostos sem nenhuma privacidade, privados da dignidade de uma simples cortina a separá-los dos doentes do lado. Muitos destes doentes são dependentes, com patologia crónica agudizada, muitos doentes ainda independentes mas a necessitar de cuidados diferenciados, que dificilmente podem ser cabalmente vigiados ou acudidos em caso de agravamento, uma vez que o amontoado de macas, impede os profissionais de alcançar os que necessitem. A simples necessidade de um copo de água pode ser uma grande dificuldade. Um autêntico depósito de seres humanos em sofrimento!
Encontramos neste cenário médicos internos e especialistas de Medicina Interna que tentam tratar os doentes no meio deste caos. Uma autêntica zona de guerra, embora com menos sangue, pois estamos na área dos doentes com “patologia médica.”
Na Área Cirúrgica, mais exígua, as macas estão mais arrumadas, mas o sofrimento não é menor quer nos doentes, quer nos profissionais que encontrámos. Dos vários internos e especialistas com quem falámos, percebemos o sofrimento ético em que se encontram, tentando dar resposta aos doentes a seu cargo, e à gestão da sua vida familiar e estudo, dado o grande número de turnos de urgência (acima dos limites legais), que são obrigados a cumprir. Parece que estamos numa cidade de terceiro mundo, embora com macas mais sofisticadas e um edifício mais bonito!
Nos médicos transparece o desgaste de muitas horas de serviço na urgência, tendo alguns 50 dias de folga por gozar, sem que lhes seja concedido o direito de as gozar. Condições básicas de trabalho, que não lhes são concedidas, como um vestiário onde trocar roupa ou tomar um banho no fim do turno de urgência, ou um espaço onde possam descansar durante os turnos de 12 ou 24 horas consecutivas. Não há o mínimo de dignidade.
Que medidas tomou ou considera tomar o Conselho Administração do CHUC para dar condições dignas aos médicos e aos doentes? Não há nenhuma enumerada, parece que esta realidade está muito distante das suas preocupações e dos seus gabinetes, onde médicos e doentes não passam de números de produção! E assim vamos numa cidade como Coimbra - Cidade da Saúde, palavras que não passam disso mesmo, ocas de significado. É impossível passar ao lado de todo este sofrimento sem uma indignação extrema. Aqui está a diferença entre o viver e o ouvir falar!
Chegámos à urgência dos Covões e parece que estamos noutra cidade. Edifício também bonito e novo, melhor construído e pensado. Doentes em quartos com macas separada por cortinas, monitorizados, com enfermeiros e médicos a conseguirem dar resposta humanizada. Existem, ainda muitos espaços individuais para doentes que se encontram vazios. Corredor livre, onde espaços destinados a macas se encontram vazios. Vestiários e salas de pausa disponíveis.
Ao lado da urgência, o antigo serviço de imagiologia, outrora em grande movimento com exames programados e urgentes. Sala de TAC com luzes e equipamento ligado, mas sem exames para fazer, apesar da extensa lista de espera para estes exames. Corredores e salas vazias. Encontramos alguns técnicos e um único médico de imagiologia, interno do 4º ano, em estágio no CHUC, mas proveniente de outro centro hospitalar, na sala de relatórios, a trabalhar sozinho. Um claro e chocante subaproveitamento de recursos físicos e humanos. É a consequência objetiva do esvaziamento dos Covões, outrora hospital central, vibrante de atividade urgente e programada com uma filosofia de prestação de cuidados reconhecidamente humanista para doentes e profissionais.
É nisto que foi transformada a saúde em Coimbra, perante a passividade da população e de alguns políticos, onde se inclui a Ministra da Saúde, outrora administradora do Hospital dos Covões e deputada eleita por Coimbra!
Está anunciada uma nova urgência para o polo HUC, com início de construção prevista para Outubro de 2022 que decorrerá por um período previsível de 6 meses, sem qualquer plano definido para dar resposta aos doentes que recorrem a ambos os polos de urgência, ou quanto à tipologia da urgência os Covões. Ficámos ainda a saber que no projeto da nova urgência dos HUC, não foram previstos, mais uma vez, vestiários médicos ou áreas de descanso, como se as condições de higiene e segurança do trabalho médico, não fossem elementos a ter em consideração num serviço hospitalar.
Retrato emocional, sem dúvida! Somos médicos e dirigentes que defendem um SNS humanizado, uma gestão adequada e eficiente de recursos, condições de trabalho para os médicos e restantes profissionais.
Perante estas duas realidades distintas numa mesma cidade, com obras à vista na pior altura possível, o SMZC irá questionar a Administração do CHUC, a ARS Centro e o ministério sobre que medidas imediatas pensam tomar para resolver a desumanização e indignidade de condições para médicos e doentes no polo HUC e o subaproveitamento da urgência do polo dos Covões.